Abandono de incapaz pode ser resultado de descaso não só de responsáveis, como também da sociedade

Laura Posterlli, com supervisão de Karina Anunciato

O crime de abandono de incapaz tem pena, caso ocorra uma lesão grave, de um a cinco anos; se ocorrer morte, pode chegar até 12 anos (Foto: Reprodução)

Nos últimos sete dias, duas crianças foram encontradas andando sozinhas nas ruas de Campo Grande – uma no bairro Santo Amaro, e outra no bairro Lageado. Nessa última terça-feira (23), ainda, três crianças foram descobertas sozinhas em uma residência no Santa Luzia, sem condições de higiene. O crime de abandono de incapaz é responsabilidade da sociedade – em entrevista à FM Educativa UCDB 91.5, o delegado Roberto Morgado Pires, da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA), falou sobre o assunto.

De acordo com o Art. 133 do Código Penal, o crime de abandono de incapaz caracteriza o ato de “abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono”. Casos do tipo fazem notícia quase toda semana em veículos de comunicação do país inteiro e, apesar de o termo às vezes causar confusão, Roberto explica que o crime não é exclusivo à menores:

“O crime de abandono de incapaz, ele não tem como vítima apenas a criança e o adolescente. Comete ele todo aquele que abandona uma pessoa que está sob o seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade e que não pode, não tem condições de se proteger dos riscos que são inerentes a esse abandono”, ressaltou. “Não necessariamente precisa ser uma criança ou adolescente: um idoso, uma pessoa com deficiência, uma pessoa que por qualquer razão não possa se defender dos riscos inerentes da vida, pode ser vítima”, disse o delegado.

Pires explica que uma criança de três, cinco, dez anos, corre inúmeros riscos ao ser deixada sozinha – desde asfixia com cobertores e queimaduras de fogão, até um dos mais preocupantes: a possibilidade dessa criança sair para rua, onde fica exposta a incontáveis outros perigos. 

“A criança pode sair de casa, abrir a porta, e sair no trânsito – e pode ocorrer algo grave”, apontou o delegado. “Podem ocorrer quedas, afogamentos… é uma infinidade de riscos que a criança, a depender da idade e do grau de compreensão, pode estar exposta”, explicou.

O crime de abandono de incapaz, sem que ocorra dano à vítima, tem pena básica de seis meses a três anos, mas pode ter a pena aumentada de até um terço. No entanto, caso ocorra uma lesão grave, a pena vai de um a cinco anos; se ocorrer morte, pode chegar até 12 anos. Ainda que os pais ou perpetradores do crime de abandono sejam os maiores responsáveis, aqueles em torno podem não estar isentos de culpa. Rodrigo lembra que, como sociedade, temos a obrigação de auxiliar essas pessoas ou crianças, prestar socorro ou denunciar casos conhecidos.

“Nós que vivemos em sociedade, todos nós, temos uma obrigação legal de prestar auxílio a quem esteja em uma situação de perigo, ou que necessite de ajuda”, atestou Pires. “Aquele que, por parte, não prestar esse auxílio, comete, inclusive, o crime de omissão de socorro, também com previsão no Código Penal e com pena de até seis meses”, alerta. “A pessoa que se depara com uma criança transitando na rua à meia-noite, sozinha, ela não tem a faculdade de ajudar ou não, ela é obrigada a ajudar”, exemplificou o delegado.

Rodrigo Morgado Pires relembra e ressalta que, apesar de o DEPCA lidar com casos de crianças e adolescentes, o crime de abandono de incapaz se aplica à todos; como por exemplo, o caso da semana passada (17) em que uma senhora idosa foi encontrada vivendo em condições insalubres em sua casa após abandono pela família. O desamparo de pessoas incapacitadas por bebida ou acidentes também são cabíveis do crime de abandono de incapaz.

O que fazer, então, caso se presencie um abandono de incapaz? Rodrigo explica que, primeiramente, deve-se abordar a pessoa ou criança, coletando informações que possam ser úteis para identificar de onde ela é, qual sua família, se mora perto. A partir daí, o próximo passo é acionar as autoridades.

“Se é uma situação que está ocorrendo, a Polícia Militar é a que dá a primeira resposta em situação de flagrante e é o órgão que pode ser acionado; o Conselho Tutelar também pode ser acionado e se for uma situação que não é mais flagrante; a Delegacia de Polícia Civil também é um órgão para registro do caso para posterior apuração”, informou Rodrigo.

“Se a vítima for criança ou adolescente, a DEPCA é a delegacia da capital que tem atribuição para apurar um quadro. Se não for uma criança ou adolescente, em qualquer delegacia o quadro pode ser registrado e será distribuído depois para delegacia com atribuição para apurar”, finalizou.

Caso você saiba ou presencie algum caso de abandono de incapaz, não se omita. Denuncie:

Polícia Militar – 190;

DEPCA – (67) 3323-2500;

Conselho Tutelar Sul (Vila Nova Artigas): (67) 3314-6370; 3314-4482 + Ramal 60; número de plantão é (67) 99907-4835;

Conselho Tutelar Norte (Rua São João Bosco): (67) 3314-4482 + Ramal 6100/6104 ou (67) 99979-6299;

Conselho Tutelar Centro (Sebastião Lima): (67) 3314-4337, 3314-4482 + Ramal 6101/6105; número de plantão: (67) 99939-9585;

Conselho Tutelar Bandeira (Rua José Freitas Guimarães): (67) 3314-4482 + Ramal 6121 e (67) 99907-3532;

Conselho Tutelar da Lagoa (Rua Panambi Verá): (67) 99812-5431.

A entrevista completa com Roberto Morgado Pires, você confere aqui: